Revisores e Consultores - Edição especial do XIV congresso OROC

Entrevista com José Rebouta, Partner, Audit & Assurance, co-Head of Industry & Services da Mazars Portugal

Este ano comemoramos os 50 anos da profissão de Revisor Oficial de Contas. Durante este tempo o país evoluiu significativamente. Qual o papel que mais reconhece aos auditores e aos ROC, durante este período?

Nas últimas décadas o mundo evoluiu para um mercado global informado, com consumidores exigentes e sofisticados, colaboradores preparados, centros de competências partilhados, formas distintas de organização do trabalho, shareholders influentes…tudo isto contribuindo e exigindo uma melhor corporate accountability. Este paradigma é ainda influenciado por uma opinião pública exigente e reguladores ainda mais vigilantes, com adicionais exigências em termos de conteúdo e relevância da informação financeira e da informação não-financeira. Trata-se de uma evolução positiva e o desafio é que permaneça equilibrada e responsável.

As empresas são um poderoso motor de criação recorrente de riqueza e mobilização de recursos e é decisivo para o ciclo de confiança que o compromisso de toda a comunidade – empresa e stakeholders – seja mantido e monitorizado. A missão do ROC inscreve-se em servir o interesse da comunidade, contribuindo para este ciclo de confiança, através do contínuo fortalecimento da contabilidade e do relato financeiro e auditoria, pela adesão a normas profissionais robustas e de elevada qualidade, impulsionando a convergência internacional das mesmas e manifestando-se em assuntos de interesse público onde os conhecimentos da profissão são relevantes para o desenvolvimento de empresas e economias fortes.

Um ROC deve estar consciente do seu papel, praticá-lo com orgulho, humildade, competência e dimensão, integridade e consciência. Isto faz-se com comprometimento pessoal muito forte, no respeito das regras e normativos, no desenvolvimento de indivíduos e de equipas que formam as suas estruturas profissionais, da necessária adesão a valores comuns e regras de conduta. Um bom ROC e uma boa firma de auditoria estão comprometidos com valores de integridade, transparência e competência.

As funções de interesse público desempenhadas proporcionam aos ROC contribuir para a confiança aos utilizadores da informação financeira, com narrativas claras, completas e adequadas, importantes para a tomada de decisões.

Sabemos que a forma de proteger o interesse público é desenvolver, promover, atuar com consistência e atualidade dos valores exigindo, com base nas normas reconhecidas internacionalmente, a credibilidade da informação sobre a qual os investidores e toda a comunidade dependem e baseiam as suas expectativas e decisões. Um papel que se tem provado crítico no contexto económico e social atual. O plano de comunicação e de informação ao ecossistema completa a missão.

Os últimos dois anos têm sido desafiantes para as pessoas e para as organizações. Que balanço faz deste período, em particular para a Mazars?

É verdade que a barra está colocada em ponto alto, mas sempre esteve e estará. O mercado está a passar por um momento decisivo: as expetativas dos clientes estão a mudar, a tecnologia dá adicional capacidade aos profissionais e o foco está em consolidar a qualidade e a confiança, apresentando soluções que garantam eficiência, qualidade, recorrência, retenção de talento, sustentabilidade e o crescimento das organizações.

Hoje, as expetativas em relação às empresas vão para além do desempenho financeiro e o papel dos ROC vai cada vez mais além da transparência financeira. Neste contexto, a missão principal de uma firma como a Mazars nunca foi tão premente, reafirmando o compromisso no posicionamento de marca de desempenhar o seu papel, como auditores e consultores de referência, para ajudar os clientes a transformarem-se com vista ao crescimento sustentável.

A Mazars conquistou, em 2021, relevante posição no mercado de auditoria, fiscalidade e consultoria em Portugal. Os resultados obtidos estão alicerçados num plano estratégico de crescimento e diversificação da oferta e valorização da qualidade, num mercado em que a confiança é e continuará a ser um fator decisivo. O modelo de negócio da firma e o delivery ao ecossistema faz-se através da ampliação de produtos inovadores, que se inscrevem na qualidade e contributo de equipas especializadas.

Numa perspetiva de maximizar a capacidade e conhecimento das nossas Pessoas e responder a necessidades de flexibilidade e autonomia implementámos mais soluções digitais, centralizando a partilha de conteúdos e formações relevantes, desenvolvidos quer externamente por especialistas, quer pelas nossas equipas em todo o mundo.

A adaptação a novas questões exige um investimento em liderança, que na Mazars conta já com ações de reflexão peer to peer, networking entre gestores e troca de melhores práticas, formação/treino/inspiração através de ferramentas de gestão de pessoas, acompanhamento individual a todos os participantes, reflexão pessoal e autodesenvolvimento através da utilização de ferramentas de self awareness, entre outras iniciativas numa ótica de capacitação de talento.

Que transformações podem vir a moldar o papel da profissão e a acrescentar-lhe novo dinamismo?

Entendemos que a opção por mecanismos que potenciem a diversidade é relevante. É importante dar adicional resposta à questão da qualidade da auditoria permitindo maior diversidade e investimento das Sociedades de Revisores Oficiais de Contas.

O não acolhimento do modelo de Auditoria conjunta (joint audit) é, sem dúvida, no nosso entendimento, o aspeto menos conseguido da transposição da diretiva para o mercado nacional. Se a opção está inscrita no regulamento europeu, porque não foi acolhida em Portugal? Opção não é obrigação. A própria Comissão Europeia reconhece, no texto legislativo, que a nomeação de duas sociedades de revisores oficiais de contas reforça o ceticismo profissional, a nossa capacidade de questionar e contribui para a qualidade da auditoria. E diz mesmo que as entidades de interesse público – estamos a falar das várias entidades do setor financeiro, das cotadas ou que tenham valores mobiliários cotados, por exemplo – deveriam ser incentivadas a nomear mais que um auditor. E por isso, não entendemos porque não foi criada, até agora, esta opção em Portugal. Uma empresa nacional que queira ter a iniciativa de nomear um segundo revisor oficial de contas, simplesmente não pode, porque o enquadra[1]mento regulatório em Portugal não lhe permite.

A verdade é que não somos só nós a considerar que a adoção da joint audit pode ser muito positiva para o mercado. No final de março, o ECOFIN emitiu uma opinião no sentido de apoiar o desenvolvimento desta área do negócio e a diversificação do mercado, para permitir adicional investimento dos atuais players e o surgimento de novos players. Esta posição estaria subentendida com a Reforma Europeia de Auditoria de 2016, mas agora fica reforçada.

Em que medida se integra a transformação digital da profissão numa visão global do serviço prestado?

À atividade da Auditoria adicionam-se novos domínios com uma importância cada vez mais destacada, que incluem o digital e os processos de transformação associados a tecnologias emergentes, exemplo da analítica de informação e dados, da inteligência artificial ou da Internet das Coisas (IoT). Este dinamismo acrescido desenvolve a exigência de especialização, sustentado em equipas dedicadas a áreas de intervenção como a digitalização, os criptoativos, a cibersegurança ou a sustentabilidade. Poder contar com Pessoas e equipas tecnicamente habilitadas e aptidões específicas é, hoje, um fator crucial à gestão, atração e retenção de talento no setor.

A tecnologia é zona de investimento necessária, que deve ser realizada em simultâneo com planos de desenvolvimento dos auditores e orientação na liderança e interação, de forma a garantir conhecimento e competências críticas e possibilitar uma resposta efetiva no que é o compromisso de ser ROC, desenvolvendo a profissão e assegurando a clara compreensão e confiança nos processos.

Quais os principais objetivos da Mazars para os próximos dois anos?

O objetivo a médio-prazo da Mazars passa por manter o crescimento verificado ao longo dos últimos anos, solidificando o lugar conquistado no mercado português, enquanto se adapta a novas circunstâncias, quer em termos de recursos humanos e de tecnologia, quer de novas valências, garantindo uma oferta de serviços completa, diversificada, profissional e de elevada qualidade.

A implementação de um plano estratégico para os próximos anos reforça a intenção de continuar a acelerar a transformação da firma e fortalecer a sua posição de referência em dimensões complementares: oferecer uma perspetiva diferente nas áreas de auditoria, fiscalidade e consultoria; continuar a melhorar o serviço disponibilizado através de um leque alargado de soluções; e desenvolver o talento interno enquanto organização de conhecimento intensivo e escola de excelência.

A aposta no talento parece-nos crucial para os desafios que se apresentam à Auditoria, particularmente no que respeita à introdução do desafio tecnológico. A tendência de eliminação de trabalho de menor valor acrescentado aos processos, permitirá atrair gerações que pretendem um work-life balance diferente. O mundo da dediação às tarefas tenderá a terminar havendo uma necessidade, cada vez maior, por parte dos colaboradores, independentemente da hierarquia ou função, em sentirem que fazem parte de algo que influencie o ecossistema empresarial, a economia e a sociedade em geral de uma forma positiva.

Contacte-nos