A tão esperada retoma será alavancada, pelo menos para as empresas que o conseguirem, por diversos mecanismos (novas linhas de crédito bonificadas, o famigerado Plano de Recuperação e Resiliência, o novo quadro comunitário em matéria de incentivos financeiros, entre outros), nos quais se encontram também os benefícios fiscais.
Assim, em vésperas da primeira votação da proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2022 na generalidade (à data que escrevemos o presente artigo), e com novos benefícios fiscais em cima da mesa – e.g, o Incentivo Fiscal à Recuperação–, está lançado o mote para o que consideramos ser um tema muito pertinente para as empresas, em particular, quando o recurso a outras “boias de salvação” reveste uma incerteza maior, desde logo pela dependência da boa vontade e dinamismo de terceiros. Falemos então de benefícios fiscais no contexto exclusivo das empresas.
Como ponto prévio, frisamos que os benefícios fiscais, constitucionalmente consagrados, têm como propósito a tutela de interesses públicos, naturalmente distintos da própria arrecadação de receita. São exemplos daqueles interesses – a prossecução do investimento externo, a capitalização das empresas, a inovação empresarial ou até a renovação do tecido urbano.
Os benefícios fiscais, que podem ser de natureza subjetiva (em função do sujeito passivo) ou objetiva (em função do ato, do facto ou do negócio jurídico), têm um cariz excecional, por resultarem numa redução da receita do Estado, pelo que a sua utilização é sempre condicionada.
Por esse motivo, os benefícios fiscais podem ser elegíveis apenas para determinados setores de atividade ou empresas localizadas em regiões específicas, implicar a criação de novas linhas de produção ou de novos postos de trabalho e impedir a distribuição de lucros ou reservas, entre outros. A sua atribuição pode também estar dependente da existência de razões económicas válidas.
Feita esta breve resenha, debrucemo-nos agora sobre o âmago deste artigo. Do nosso ponto de vista, e seguindo o que já são as melhores práticas de determinados setores de atividade, como o imobiliário, na prossecução de projetos de reabilitação urbana, os benefícios fiscais devem ocupar o seu lugar a montante, aquando da discussão da estratégia de negócio.
Todavia, assistimos com frequência a uma utilização reativa e tardia dos benefícios fiscais. No caso paradigmático do IRC, são muitas as vezes em que apenas nos dias que antecedem a entrega da Declaração Modelo 22, em maio do ano seguinte, os “decisionmakers” dedicam tempo a uma reflexão sobre o assunto. Ora, entendemos que uma abordagem daquela natureza tem dois efeitos adversos. Primeiramente, reduz-se a possibilidade de utilização / maximização de benefícios fiscais potencialmente elegíveis em determinada situação. Veja-se, a título de exemplo, o financiamento de sociedades pelos sócios, em que muitas vezes é desconsiderado o efeito do juro nocional resultante da aplicação do benefício fiscal da Remuneração Convencional do Capital Social.
Em segundo lugar, poderá também dar-se o caso de incrementar o nível de risco associado ao recurso a determinado benefício fiscal. Situação muito comum, designadamente, na utilização cumulativa de incentivos financeiros e benefícios fiscais e a sua articulação com as normas comunitárias.
Em face do exposto, urge uma abordagem disruptiva que rompa com aquela realidade. De facto, os “decisionmakers” têm que olhar cada vez mais para os benefícios fiscais como instrumentos que, quando geridos de forma estratégica, geram mais valor para a empresa e para a estrutura acionista.
Esta mudança de paradigma implica, naturalmente, estar a par dos variadíssimos benefícios fiscais existentes no ordenamento jurídico-tributário português e os seus constantes desenvolvimentos, mas também uma articulação ágil e criativa dos mesmos com os objetivos da empresa, procurando ir para além do imediato e do óbvio.
Isto porque, do nosso ponto de vista, a eficaz utilização de benefícios fiscais pode implicar a reestruturação de modelos de negócio ou o redesenho de cadeias de valor, sempre com o foco na geração de valor e sustentabilidade económica das Empresas. E, nesse sentido, a procura atempada de apoio especializado nestas matérias é crítica para o sucesso daquela disrupção.